Tenho sede, uma absurda vontade de goles grandes de palavras "malditas" (...)

Moço

A vida passa correndo, eu sei. E realmente estou vivendo? Ou apenas remexendo os velhos baús de histórias? Decifrando as inúmeras palavras soltas e ignorando as que estão no ar... Deus é generoso, e embora eu seja apenas uma poetisa louca, com pele aveludada, uma errante singela e apaixonada, uma amante desnuda, escondendo amores perfumados, pensamentos que abocanham-me, feito gula infantil. Acelera-me o cio, fora de prumo, gritos roucos, atordoada de amor. 

Mas, minh’alma ainda debruçada na janela da solidão, eu nua, tentando atrair o moço bonito do outro lado da rua. E penso como seria nós dois abraçados e fadigados... Sem razão, feito andar nos trilhos, enamorados. Isto seria uma alegria macia, me arrepia a nuca em pensar, numa intensa ansiedade, feito jogo provocante, e sigo extasiada neste fervor absoluto... Neste querer de enredos breves e suor derramado no corpo. Mais agora só penso nos beijos quentes, nas mãos tateando minhas curvas e uma simples taça de vinho sobre a mesa. 

E embriagada deste sonho pouco, que estreita minha tristeza, tento não dormir sobre a colcha colorida da solidão, porque agora tenho sede e não quero a insônia e seu veneno estúpido, sinto-me encharcada de volúpias sem fim, em mim, delicadamente... E banhada, feito flor que se abre na primavera e perfuma pedestres na calçada, sigo pulverizando um sabor carente, delírios... Numa cadeia frenética, exalando minhas agonias, e desatando todos os meus desafetos, pétala por pétala, todos os tesões e palavrões da minha língua afiada e doce. 

E os restos de mim, os espinhos sangrentos, enrosco em meus passos, antes miúdos e agora apressados na noite que aponta na minha janela. Isto sim é amor! Porque me dói inteira. Porque ainda estou faminta de calafrios, porque ainda sou abelha sem mel. Isto é loucura! Disto também sei. Porque me delicio nas frases perversas de desamor. E um simples café pela manhã já não basta, não me desperta para o dia, e lampejos de solidão ainda me encontram, tento me esconder e não sei onde, viajar para fora de mim é inútil. 

O moço já se foi? Me lambuzo com medos bobos e me disfarço com qualquer motivo, porque agora sou o fracasso. Torname-ei sã, deixando meu eu antiga ir embora, e prefiro a liberdade serena, fitando apenas um gozo tosco e fora de moda. Porque estou à flor da pele. Porque não quero derramar lágrimas na minha pele jovem novamente. Amor... Amor... Amor... 

O refrão da música soa repetidamente em minha memória, feito lembrete tatuado na palma da mão. Vou continuar o remendo no pobre coração que ainda me resta, enquanto aguardo o moço voltar.

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