Tenho sede, uma absurda vontade de goles grandes de palavras "malditas" (...)

Contos que conto...O Causo de Zé

Ele ainda vive com o desespero preso em si, o choro, os calos nas mãos iguais, Zé Evandro o mesmo pedreiro louco, que um dia fora o melhor vizinho e um pai sonhador.

Vive sozinho em uma casa que se ouve nas lacunas um choro infantil, a criança que a avó tanto almejou um dia apareceu e a vida levou depressa.

Zé vive lá, na casa empoeirada, no meio do nada, um homem esquecido pelo mundo, com gosto da morte nos lábios, com a solidão na alma e o desespero nas mãos.

O sorriso é gasto no rosto, uma lamparina toma conta da sala, os móveis rústicos e sujos de sangue do parto. A noite é seu pior tomento, seu fantasma, gritos que ecoam embutidos naquele velho lar.

Seu filho nascera com a morte esculpida no corpo, o ventre da mãe apenas suportou meses uma angústia, o pequeno foi enterrado no jardim junto ao córrego e todos os dias Zé faz um novo funeral, flores, brinquedo e um punhal em forma de lágrima que finca os seus olhos.

O momento noturno é o pior pesadelo, o choro toma o ar, invade, atordoa a loucura necessária. A bebida pura e quente lhe faz companhia e esquecer o pulso que está ainda virgem.

D.Zinha, a esposa de muitos anos, hoje um zumbi perdido na casa, não esquecera a primeira vez que pegou seu piá nas mãos e assoprou sua narina, no intuito que revivê-lo.

Ela está lá, guardada na velha casa, embutida na parede da sala, alguns centímetros de cimento colam seu corpo ao tijolo antigo, um ótimo revestimento e um quadro cobrindo os arremates. O quadro está bem posto, combinando com o ambiente, embora o sangue seco cobrindo os móveis antigos, completava aquela cena estúpida, ainda assim era a realidade de Zé.

A cidadezinha abriga este sítio abandonado, o corpo de uma criança no jardim, enfeitando o dia, D. Zinha escondida na parede fazendo sala ao marido.

Chove muito, o vento está forte e frio, os olhos de Evandro filmam a grama fofa e úmida, o inverno aponta no interior do sul, os brinquedos molhados, as flores murchas, o quadro da sala torto devido o vento adentrando pela janela.

O pobre pai afoga sua mágoa em mais uma bebida, corre desesperado à entrada de sua velha casa e se ajoelha no primeiro degrau, às lágrimas caem no rosto e se juntam as águas da chuva que entorpece.

- Deus! O que eu fiz?

Zé Evandro braveja tal frase, grita várias vezes olhando para o céu e não obtêm resposta alguma, apenas uns raios no céu cinza na outra ponta da cidade.

- Um dia serei perdoado?

- Não quero mais!

- Está ouvindo Deus?

- Tire-me daqui!

O pranto domina aquele homem desesperado até a manhã seguinte. O pedido foi aceito de tal forma, um carro vindo da cidade para em frente ao seu jardim, dois homens tentam colocar a camisa de força em Zé.

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